O bom exemplo de uma Magistrada
Fátima Nancy Andrighi: recado dado
Por Jorge Serrão - serrao@alertatotal.net
Os holofotes da imprensa em torno do impedimento da Presidenta Dilma Rousseff fizeram a opinião pública não dar muita importância a um bom exemplo político institucional, ocorrido no dia 6 de maio deste 2016. O fato altamente relevante nestes tempos de guerra de todos contra todos foi envio de uma carta da ministra Fátima Nancy Andrighi aos colegas do Superior Tribunal de Justiça. A Corregedora Nacional de Justiça informava que abria mão de concorrer à presidência do STF, mesmo tendo a preferência pela tradição da obediência à ordem de antiguidade.
Nancy Andrighi poderia ter a honra de ser a primeira mulher a presidir o STJ, na eleição prevista para 30 de junho, com posse programada para setembro. Nancy demonstrou um raro desprendimento. Suplantou o desejo natural de conquistar um posto de comando. Venceu a vaidade para dar uma rara prova simbólica de coerência. Desde que assumiu o posto de Corregedora Nacional de Justiça, em 26 de setembro de 2014, Nancy tenta focar sua atuação na "organização do Judiciário e na adoção de medidas administrativas que melhorem seu funcionamento". Bingo: Andrighi identificou onde reside um dos maiores problemas institucionais do Brasil...
O conteúdo da carta de Nancy Andrighi é emblemático para quem sabe fazer leitura simbólica nas entrelinhas: "Sempre tive e tenho absoluta devoção e me sinto realizada na atividade de estudar e julgar, por isso, decidi retornar à jurisdição. Para que, sobre a minha escolha, não paire dúvidas para os Estimados Colegas, afirmo-lhes, não há motivo de doença, nem receio de gestão ou qualquer outro que possam buscar, todos serão pura imaginação ou especulação. Tenham, sempre, a mais absoluta certeza, essa escolha tem fundamento exclusivo, na minha incondicional devoção pela jurisdição, muito mais do que ao apego à inegável honraria de ser presidente do Superior Tribunal de Justiça".
A gaúcha Nancy Andrighi, especializada em Direito Processual Civil, só tem previsão oficial de aposentadoria programada para o dia 27 de outubro de 2022. Portanto, ela ainda terá muito tempo para atuar como magistrada. Na Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, Nancy Andrighi teve a espinhosa missão de regulamentar a decisão do CNJ que impede juízes de atuarem em causas patrocinadas por escritórios de advocacia nos quais atuem parentes próximos.
Recentemente, Nancy reclamou que havia 10 ministros com parentes advogando no STF. A corregedora frisou que esta era "uma das mais nocivas práticas existentes no Poder Judiciário brasileiro". Nancy também causou um terremoto no STJ ao abrir procedimento administrativo disciplinar contra o ministro Marcelo Navarro. O magistrado foi citado na delação premiada do senador cassado Delcídio do Amaral como sendo uma nomeação do governo Dilma para interferir nas investigações da Lava Jato em favor de empreiteiros presos.
Certamente, por tal declaração e por outros atos de probidade republicana, no meio do caminho, Nancy deve ter colecionado muitos inimigos poderosos - que poderiam até sabotar a eventual eleição dela ao comando do STF. Nancy abortou o golpe antecipadamente... E deu um exemplo raríssimo de desapego ao poder que deveria ser copiado na magistratura brasileira. O grave momento institucional, em ritmo de ruptura violenta, exige equilíbrio, prudência e sabedoria na relação dialética entre a "espada e a balança".
Nancy Andrighi deu uma fundamental contribuição simbólica ao complexo e complicado combate ao desgoverno do crime institucionalmente organizado. Na leitura reversa permitida pela desistência dela em concorrer à presidência do STJ, fica entendido que quem assumir o cargo jamais pode ser conivente com as coisas erradas no Judiciário. O fato lamentável da desistência dela é que o STJ deixa de ganhar uma "Presidente" cujo "defeito" foi ter cumprido fiel e corretamente sua função de corregedora.
O exemplo da magistrada merece ser copiado e analisado por tantos outros ocupantes dos outros poderes no Brasil. Em tempos de mudanças inevitáveis exigidas pela maioria consciente da sociedade, já passou da hora de o Judiciário cumprir sua missão de fazer mais e melhor Justiça. Só assim vamos neutralizar, superar e vencer a guerra contra as organizações criminosas.
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