Canadá inventa armadilha barata e não-tóxica contra
o mosquito ‘Aedes aegypti’
As armadilhas são relativamente fáceis de fazer, e há uma oferta quase inesgotável de matéria-prima (estima-se que 1,5 bilhão de pneus sejam descartados no mundo por ano)
Em uma inovação que pode ter amplas implicações para países tropicais, pesquisadores canadenses desenvolveram um meio barato, eficaz e não-tóxico de reduzir as populações de mosquitos transmissores de doenças: usando um objeto comum e que, ironicamente, os insetos adoram usar para reprodução – pneus velhos.
“Estamos transformando uma arma que os mosquitos usam contra nós – pneus velhos – contra eles”, diz Gerardo Ulibarri, professor de química medicinal e ecossaúde na Laurentian University.
Ele desenvolveu o equipamento, conhecido como ovillanta (derivado da expressão em espanhol para ‘pneus para colocar ovos’), para destruir as larvas do Aedes aegypti, o mosquito bem conhecido dos brasileiros que carrega os vírus da zika, dengue, chikungunya e febre amarela.
A ovillanta oferece uma situação em que todos ganham na luta contra essas doenças, que juntas atingem milhões de pessoas por ano no mundo – principalmente em países tropicais – e provocam dezenas de milhares de mortes, segundo dados da Organização Mundial da Saúde.
O aparelho acaba com a necessidade de uso de inseticidas que podem causar danos ao ambiente e efeitos colaterais em outros insetos – inclusive aqueles que se alimentam de mosquitos. Gerações seguintes de mosquitos podem adquirir resistência a inseticidas, tornando essas substâncias cada vez mais ineficazes, diz Ulibarri.
Descarte de lixo
A invenção também oferece uma solução – embora em pequena escala – para um dos problemas mais complicados de destinação de lixo no mundo: o que fazer com pneus velhos.
As armadilhas também são baratas e relativamente fáceis de fazer, e há uma oferta quase inesgotável de matéria-prima (estima-se que 1,5 bilhão de pneus sejam descartados no mundo por ano).
Ulibarri tinha desenvolvido outro tipo de armadilha para ajudar a conter um surto de febre do Nilo Ocidental que atingiu a região de Ontário em 2012, mas a solução se mostrou cara e de difícil execução em países em desenvolvimento.
“Eu comecei então a pesquisar materiais e escolhi pneus porque quase 30% dos mosquitos Aedes se reproduzem em pneus cheios de água”, explica. “Nós não planejamos daquela forma – foi uma grata surpresa.”
Testes iniciais mostram que a ovillanta é bem eficaz. Em um estudo de dez meses na Guatemala, pesquisadores descobriram que 84 ovillantas instaladas em sete bairros na cidade de Sayaxche destruíram mais de 18 mil larvas de Aedespor mês.
Isso é quase sete vezes mais do que as armadilhas convencionais. E nenhum caso novo de dengue foi registrado nas áreas naquele período – tipicamente, cerca de 40 casos seriam registrados, afirma Ulibarri.
Modus operandi
A ovillanta, que consiste em dois pedaços de meio metro de pneu e uma válvula de drenagem em forma de tubo, imita um ambiente de reprodução do Aedes. Um pneu rende três armadilhas.
A metade inferior do equipamento é preenchida com dois litros de água, com as chamadas faixas de pouso: pedaços de papel Pellon ou papel de germinação de sementes onde as fêmeas do Aedes põem ovos.
“Os mosquitos não colocam ovos em superfícies secas – eles precisam de umidade para chocar”, diz Ulibarri. “Em clima quente, você tem que adicionar água de vez em quando porque ela evapora muito rápido.”
A água no aparelho deve ser drenada duas vezes por semana em um recipiente coberto com um filtro; algo tão simples como um pedaço de pano branco funciona bem porque a cor deixa as larvas bem visíveis, afirma o criador da invenção.
Depois disso, o usuário deve destruir os ovos, despejar a água de volta naovillanta (enchendo-a com água fresca) e instalar duas novas faixas de pouso.
“É importante reciclar a água porque depois que os ovos eclodem, eles liberam um feromônio dentro da água que informa os outros mosquitos que aquele é um lugar bom e seguro para pôr ovos,” diz Ulibarri, cujo trabalho é financiado pelo projeto Grand Challenges Canada.
“Entender o inimigo é a melhor maneira de combatê-lo.”
Resultados
Geralmente, leva cerca de um mês – o ciclo de vida médio de um Aedes fêmea em clima quente – até as armadilhas começaram a impactar as populações locais do mosquito.
Duas ovillantas por acre podem diminuir significativamente a prevalência do mosquito, e quanto mais aparelhos, melhores são os resultados, afirma Ulibarri.
Até agora, os dispositivos foram testados na Guatemala e no México, e Ulibarri diz que sua equipe foi convidada para fazer mais testes no Brasil e Paraguai. E, afinal, qual é o potencial da ovillanta?
“Acho que, se usada corretamente, ele pode ter um impacto muito forte sobre diferentes doenças tais como zika, chikungunya, dengue e febre amarela. E com um atrativo diferente: nós também podemos ser capazes de combater os mosquitos Culex e Anopheles (que carregam o vírus da febre do Nilo Ocidental e o da malária, respectivamente)”, afirma Ulibarri.
“Se todos trabalharmos juntos, talvez possamos finalmente fazer alguma diferença.”
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